segunda-feira, outubro 09, 2006

Da lata presidencial ao Triunfo dos Porcos

É claro que a cortesia fica sempre bem no momento da despedida, mas entre cortesia e falsidade o fosso ainda é grande. E é preciso ter vergonha na cara ou, pelo menos, uma lata do caraças para desatar agora a fazer elogios àquele que era o seu primeiro alvo a abater mal o Senhor Silva ganhasse as eleições. Afinal não foi preciso pressionar um novo escândalo para lhe mandar ir com os porcos, pois em Democracia há mandatos que chegam ao fim.
Souto Moura era um PGR incómodo, e incómodo para muita gente, independentemente da cor política, uma ovelha negra na Procuradoria Geral da República e um alvo a abater. Tornou-se moda falar mal do mandato do Souto Moura devido aos escândalos publicitados na comunicação social até aos limites do ridículo, o seu nome foi difamado e motivo de anedota. E isto porquê? Porque, possivelmente, desde o pós-25 de Abril que os podres dos que estão lá em cima não são revelados desta maneira e desde essa altura também que os lá de cima se aperceberam que afinal não são intocáveis como acreditavam ser. Também nós, cá de baixo, nos começámos a aperceber que o que os mantinha lá em cima não eram asas cintilantes, mas mentiras, roubos e coisas piores.
E como é que se destruiu a credibilidade de quem tentava lutar contra o sistema? Nada mais fácil: manipular a comunicação social de maneira a fazer passar cá para fora uma versão cor-de-rosa dos polémicos processos em tribunal, promovendo a imbecilidade dos agentes policiais e judiciais e fazendo dos réus arguidos e vice-versa. Não foi bem isto que aconteceu, pensarão vocês, porventura? Vejam lá melhor:
1- Não é verdade que os desenvolvimentos do caso "Saco Azul" transformaram uma autarca corrupta e um escândalo que ameaçava a estrutura dirigente do PS numa santa imaculada de Felgueiras e num lavar de mãos da parte dos dirigentes do partido?
2- Não é verdade que o temido "Processo Casa Pia", que envolvia altas figuras da política e da comunicação social (sendo que muitas delas nunca se saberão ao certo os nomes) foi levado a uma mediatização absurda com o objectivo de desacreditar as vítimas e limpar o nome dos culpados (já estão quase todos safos...), de tal maneira que hoje em dia são eles os inocentes e os miúdos é que são os culpados?
3- Não passou o caso do "Envelope 9" de um crime de violação de privacidade e do segredo de justiça de certos jornalistas para um lapso idiota da parte dos meios judiciais que se esqueceram de apagar ou codificar uma lista que, por obra e graça do Espírito Santo, foi cair de pára-quedas nos computadores do 24 Horas?
4- Não entrou o caso "Apito Dourado" num vertiginoso diz-que-disse com fuga de informação e lavar de roupa suja entre os suspeitos que até continuam a exercer a actividade pela qual estão a ser investigados, entrando rapidamente o processo nas calmas e tranquilas águas-de-bacalhau judiciais que todos nós bem conhecemos?
Com o caminho minado desta maneira a partir de cima, é natural que o Souto Moura pouco pudesse fazer. Não foi você, Senhor Silva, que, noutros tempos, pediu para que lhe deixassem trabalhar? Pois foi exactamente isso que não deixaram o PGR que hoje termina funções fazer. E para o seu lugar, uma amigalhaço de tempos idos, uma pessoa que não chateia e que até pode dar umas abébias sem ser preciso pedir com muito jeitinho, um desbloqueador de situações difíceis através do silêncio e abanar da cabeça como uma marioneta.
A partir de hoje os lá de cima voltaram a respirar de alívio. Evocando George Orwell, os Porcos voltaram a triunfar. As "Big Man societies" de Marshall Sahlins continuam vivas e de boa saúde nos dias que correm. Não precisavas de ter ido até à Polinésia, Marshall; olha a Madeira aqui tão perto... (pode ser que eu um dia desenvolva aqui melhor este tema de que tantos exemplos são observáveis neste tubo de ensaio chamado Portugal)
Parece que eu sou o único a defender o ex-PGR mas é um direito que me assiste ao viver em Democracia. Mas em Democracia também não existem vacas sagradas... ou existem?
Quanto a Souto Moura, esse já não se livra da fama. Ficará para sempre conhecido como a ovelha negra do sistema judicial português:

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